Ao vivo: Superguidis encerra silêncio com show de duas horas e 30 músicas em SP
Em 120 minutos que passaram voando, o Superguidis compensou 14 anos de ausência de maneira emocionante. Se for só esse show (e o de Porto Alegre no próximo domingo, dia 23), já teria valido a pena esperar. Mas... pode querer mais?

texto de Marcelo Costa
vídeos de Bruno Capelas
fotos de Fernando Yokota
Nesse movimento de desibernar que vem colocando finadas bandas alternativas dos anos 2000 – como Pullovers, Ludovic, Forgotten Boys e Ecos Falsos – novamente na estrada (muitas delas com material novo), a volta da Superguidis era uma das mais aguardadas, e uma das menos prováveis. Andrio Maquenzi, voz, guitarra e um dos principais compositores da banda (ao lado de Lucas Pocamacha), sempre evitou dar esperanças aos fãs: “Show? Não vejo mais isso, sabe? Não me enxergo com trinta e vários anos cantando ‘O Banana’”, ele disse em uma entrevista publicada aqui no Scream & Yell em 2020.
Daí que quando, em 2024, um frame de uma conversa entre integrantes da banda e o pessoal do selo Balaclava Records chegou à rede mundial de computadores, o coraçãozinho dos fãs bateu mais forte. A confirmação veio logo depois: a Balaclava iria prensar o primeiro disco clássico dos caras, e eles sairiam em turnê para alguns shows – o guitarrista Lucas Pocamacha não encarou a volta, mas, como escreveu Andrio em seu Instagram, “Bichinho de três patas ainda caminha”. E dá-lhe Superguidis em formato power trio (Andrio mais Diogo Macueidi no baixo e Marco Pecker na bateria) de volta aos palcos 14 anos depois. A noite de retorno, no Cine Joia, tinha tudo para ser especial, a questão era saber o quanto…
Quando o recado na secretária eletrônica do filho de Beto Só, usado na introdução de “Riffs”, faixa “escondida” do segundo disco da banda, “A Amarga Sinfonia do Superstar” (2007), silenciou, e o trio disparou com “O Raio Que o Parta”, canção que abre o disco de estreia, muitos olhos no Cine Joia marejaram. “Malevolosidade” veio na sequência, absurdamente suja e absolutamente deliciosa, acrescida da citação de “Mesmo Que Mude”, da Bidê ou Balde, no refrão, um hino dentro de outro hino. “O Tranquêra”, “Discos Arranhados” e “O Véio Máximo” vieram na sequência, emocionais, festejadas com berros pela plateia. “É isso aí, vamos ficar todo mundo rouco hoje”, convidou Andrio, avisando: “Nós vamos tocar todo o primeiro disco, tá”.
Fechando o lado A do novo vinil, a canção que Andrio não se imaginava cantando com trinta e vários anos, “O Banana”, surgiu no set, devidamente atualizada no refrão, com “que banana que eu sou” da original sendo trocada por “que banana que eu era” na versão 2025. Ainda que acompanhada em coro pelo bom público presente (o Cine Joia ficou longe de estar lotado, mas quem compareceu marcou presença para cantar junto), ela também permitiu sacar as nuances dos arranjos no formato trio, e é óbvio que a guitarra de Lucas faz uma falta danada no som dos caras, mas a opção pela sujeira da escola jmascisana fez o som da guitarra de Andrio ecoar encantadoramente fatiando o ar no velho teatro.
O lado B do disco surgiu mais sujo pesado, quase punk (assista ao vídeo de “Spiral Arco-Iris” no fim do texto), o que justifica, inclusive, a citação de Bad Religion mais à frente na noite. Quem já tinha se dado por satisfeito em ouvir o primeiro disco na integra foi agraciado com praticamente um outro show. “Visão Além do Alcance”, do terceiro disco, “Superguidis” (2010), abriu o segundo ato da noite mostrando que o trio estava realmente disposto a compensar os 14 anos de espera do público com um show de duas horas de duração e 30 (!) músicas, com destaque para “Mais do Que Isso”, “Mais Um Dia de Cão”, a cover de “Zefini”, dos paraenses da Turbo (taí um single prontinho pra marcar essa volta), a grudenta “Riffs” (acrescida do refrão de “21st Century (Digital Boy)”, do Bad Religion) e o encerramento com “Apenas Leia” e “Não Fosse o Bom Humor”.
Para o bis, um passeio pelas raridades da banda com “Cartas na Manga” e “Primeira Série”, duas faixas que deveriam estar no quarto álbum dos Guidis (e foram reunidas no bootleg “Epílogo”, de 2012) e, ainda, uma da primeira fase do grupo, “Lucina”, presente no bootleg “Pacotão”, de 2004, fechando com chave de ouro uma noite amplamente nostálgica e deliciosamente guitarreira, que terminou com boa parte dos presentes completamente rouca, como havia previsto Andrio. Em 120 minutos que passaram voando, o Superguidis compensou 14 anos de ausência de maneira emocionante. Se for só esse show (e o de Porto Alegre no próximo domingo, dia 23), já teria valido a pena esperar. Mas… pode querer mais?
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.
– Fernando Yokota é fotógrafo de shows e de rua. Conheça seu trabalho: http://fernandoyokota.com.br