World Press Photo — a fotografia do ano

[fragmento]Mahmoud Ajjour, nove anos de idade FOTO: Samar Abu Elouf / The New York Times I. Nos tempos que correm, mesmo não ignorando a pertinência jornalística das imagens televisivas (cada vez menos, de tal modo assistimos ao espectáculo obsceno de canais "informativos" transformados em tribunais de uma razão que ninguém assume, mas quase todos reivindicam), a imagem fixa pode adquirir um valor informativo cada vez mais essencial no mundo agitado e acelerado em que vivemos.II. A fotografia assinada pela palestiniana Samar Abu Elouf, vencedora do World Press Photo, é uma dessas imagens capaz de resistir à vertigem mediática do tempo, devolvendo-nos a possibilidade de um instante (ou uma eternidade) de contemplação — e sabemos que a contemplação se tornou um valor menosprezado pela maior parte dos circuitos (ditos) sociais. III. O retrato de Mahmoud Ajjour, ferido durante um ataque de Israel a Gaza em março de 2024 (obtido em Doha, no Qatar), surge, assim, como um objecto capaz de congregar a frieza informativa com o testemunho histórico e uma infinita perturbação simbólica. IV. Objecto, sim, não no sentido corrente consagrado pelo mais medíocre jornalismo em que tudo pode ser sujeito a processos maniqueístas de objectificação; objecto como retrato, precisamente, afinal uma matriz fotográfica — com uma nobre tradição no foto-jornalismo — que foi alienando o seu fulgor clássico, ao mesmo tempo perdendo o espaço que, tradicionalmente, lhe eram dedicado.V. Estamos, afinal, perante uma imagem fotográfica que nos leva a (re)pensar os efeitos dos próprios contextos em que que as imagens são expostas — essa é, sem dúvida, uma tarefa que tem tanto de jornalístico como de político, numa palavra, cultural. >>> Video da World Press Photo Foundation, com depoimento de Samar Abu Elouf. 

Apr 18, 2025 - 23:10
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World Press Photo — a fotografia do ano
[fragmento]
Mahmoud Ajjour, nove anos de idade
FOTO: Samar Abu Elouf / The New York Times

I. Nos tempos que correm, mesmo não ignorando a pertinência jornalística das imagens televisivas (cada vez menos, de tal modo assistimos ao espectáculo obsceno de canais "informativos" transformados em tribunais de uma razão que ninguém assume, mas quase todos reivindicam), a imagem fixa pode adquirir um valor informativo cada vez mais essencial no mundo agitado e acelerado em que vivemos.

II. A fotografia assinada pela palestiniana Samar Abu Elouf, vencedora do World Press Photo, é uma dessas imagens capaz de resistir à vertigem mediática do tempo, devolvendo-nos a possibilidade de um instante (ou uma eternidade) de contemplação — e sabemos que a contemplação se tornou um valor menosprezado pela maior parte dos circuitos (ditos) sociais.

III. O retrato de Mahmoud Ajjour, ferido durante um ataque de Israel a Gaza em março de 2024 (obtido em Doha, no Qatar), surge, assim, como um objecto capaz de congregar a frieza informativa com o testemunho histórico e uma infinita perturbação simbólica.

IV. Objecto, sim, não no sentido corrente consagrado pelo mais medíocre jornalismo em que tudo pode ser sujeito a processos maniqueístas de objectificação; objecto como retrato, precisamente, afinal uma matriz fotográfica — com uma nobre tradição no foto-jornalismo — que foi alienando o seu fulgor clássico, ao mesmo tempo perdendo o espaço que, tradicionalmente, lhe eram dedicado.

V. Estamos, afinal, perante uma imagem fotográfica que nos leva a (re)pensar os efeitos dos próprios contextos em que que as imagens são expostas — essa é, sem dúvida, uma tarefa que tem tanto de jornalístico como de político, numa palavra, cultural.

>>> Video da World Press Photo Foundation, com depoimento de Samar Abu Elouf.