Afinal, o que faz um facialista? A resposta está na cara
Entre a estética e a saúde, o trabalho destes profissionais foca-se unicamente no rosto, onde a tecnologia e o poder das mãos se encontram.


Este artigo foi originalmente publicado na revista Time Out Lisboa, edição 672 — Inverno 2025
O azul foi minuciosamente escolhido para absorver os sentidos e criar uma sensação de serenidade e imersão, como quando Inês Rebelo mergulhou no oceano e teve a certeza de que queria transportar aquela mesma visão para dentro de quatro paredes. Em Setembro, ao fim de 16 anos a trabalhar como facialista, instalou-se num espaço moldado à sua imagem. O que aqui faz não tem nada de alquímico – é ciência e tecnologia aplicadas à necessidade de cada rosto.
“Estava tudo na minha cabeça”, começa por explicar. Fala do espaço, mas a frase resume tudo o resto. Há muito que Inês fez da experimentação uma aliada e isso permitiu-lhe criar os próprios tratamentos e aperfeiçoá-los ao sabor dos avanços tecnológicos e cosméticos. O objectivo é melhorar o aspecto, mas também a saúde da pele. “Sou fã da tecnologia. Acredito que conseguimos muito com as nossas mãos, mas a tecnologia traz-nos um resultado diferente, mais eficaz e duradouro. O meu objectivo é conseguir o máximo possível no menor tempo possível, sempre com uma abordagem não invasiva, claro”, resume.
Sem agulhas ou injectáveis, a fama de Inês Rebelo precede-a. É pioneira na redefinição da figura da facialista e percussora de uma nova relação entre as pessoas e o próprio rosto. “É um termo que não existia em Portugal e que voltou a trazer seriedade à estética, algo que se tinha perdido muito ao longo dos anos. Acho que agora há uma preocupação em procurar tecnologias que funcionem, produtos cosméticos que funcionem – não é só juntar estes cremes, fazer este procedimento e já está. Há uma preocupação muito grande em cuidar da pele de forma saudável, respeitando a sua estrutura e isso é muito bom”, continua.
O estúdio é composto por dois gabinetes – um está reservado a Inês e aos seus clientes, no outro encontramos Helena Pinheiro, também ela facialista, braço direito da fundadora. O aparato tecnológico está à vista – electroestimulação, luz LED, peeling ultrassónico e um laser remodelador de última geração – o Lyma –, que os seguidores dos avanços tecnológicos na área da beleza só vão encontrar aqui. Dispositivos usados sobre a pele, mas com acção bem mais profunda, que pode chegar à estrutura muscular do rosto. Massagens e soluções cosméticas fazem parte dos protocolos, com recurso a marcas como a Biologique Recherche, a Mesoestetic e a portuguesa Ignae.
“Como é que podemos dar sempre mais? Procurando tecnologias inovadoras e produtos cosméticos que, de facto, dêem resultados eficazes. Esta foi sempre a minha adição. De um único protocolo, foi crescendo, foi-se modificando. É uma busca constante”, detalha Inês, que trabalha actualmente com cinco protocolos construídos por si, reservando ainda a opção de construir um tratamento do zero para melhor adaptar a sessão às necessidades do cliente. Os preços começam nos 280€.
Inês chegou a estudar engenharia, mas o envolvimento nas clínicas de estética da mãe acabaram por se revelar irreversíveis. “Lembro-me de ir, do cheiro dos cremes, do atendimento às clientes. Mas sempre tentei afastar-me o máximo possível dali. Quando a minha mãe ficou doente, saía da faculdade e ia dar uma ajuda a atender uns telefones. Ao fim de uma semana, pensei: agora como é que digo aos meus pais que quero fazer isto para o resto da vida?”.
Hoje vê o seu trabalho como um complemento a outras abordagens da medicina estética. De forma não invasiva, consegue obter resultados na textura da pele, no tamanho dos poros, na redução da rugas ou na reposição da barreira cutânea, o que não significa rejeitar outras formas de tratar estes problemas. “Fazemos sempre essa diferenciação, mas é importante ter as duas abordagens e que as duas convivam sempre que alguém quiser recorrer a ambas. Eu atendo toda a gente, tenha feito ou não procedimentos médicos, com ou sem Botox”, remata.
Numa realidade em que a palavra facialista começa a ser amplamente reconhecida e em que cuidar da pele também já é visto como uma questão de saúde, os objectivos que traça passam todos por continuar a trazer nova tecnologia e avanços cosméticos para dentro do estúdio. Uma experimentação constante que, mais cedo ou mais tarde, culminará no desenvolvimento de uma marca própria. Sempre, claro, de olhos postos no rosto.
O poder das mãos
Sarah Lemos lembra-se bem do dia em que descobriu as maravilhas da massagem facial. “Foi durante a Covid. Eu já seguia aquela que viria a ser a minha professora – a Delphine Langlois. Comprei um gua sha e comecei a fazer certos movimentos. Nunca tinha ouvido falar em massagem facial e, de facto, estava a resultar. Comecei a investigar. Um dia, ela disse-me que ia abrir a primeira escola de facialistas na Europa, em Paris”, começa por contar.
Para esta francesa, filha de pai português e mãe espanhola, a decisão de regressar a Paris para estudar uma disciplina ainda relativamente desconhecida representou uma mudança de vida bem mais profunda. Na altura, trabalhava como enfermeira nas Urgências Pediátricas do Hospital Dona Estefânia. “Não sabia o que ia fazer, era o trabalho que eu amava. Só que cheguei a um ponto em que não era compatível com a minha vida familiar, com dois filhos. Estava cada vez mais exausta e não queria chegar ao ponto do burnout”, recorda.
No regresso, começou por acumular ambas as vocações – “ainda pior”, com massagens marcadas logo pela manhã, após noites passadas a trabalhar no hospital. A enfermagem acabou por ficar para trás. Veio depois o diploma de facialista e formações em Itália e Espanha, tudo para acumular conhecimento e aperfeiçoar a técnica. “Trabalhei 20 anos e acho que era uma boa enfermeira. Então, precisava de sentir a mesma segurança na área da massagem. Queria ser tão boa como a enfermeira que era”, remata.
A nova profissão acabaria por reconectar Sarah com a anterior. Facialista e enfermeira encontraram-se num mesmo impulso cuidador. Há cerca de um ano, decidiu criar um espaço que agregasse outras facialistas. Nasceu o Le Face Studio, auto-intitulado o primeiro ginásio do rosto do país orientado para promover a beleza natural de cada pessoa. “A nossa grande frase é come as you are e esse é o verdadeiro luxo. As pessoas usam filtros, maquilhagem, unhas falsas, pestanas – pensam que estão a corresponder a um padrão de luxo, mas isso é só uma prisão. Aqui, estamos num ginásio facial e vamos fazer com que a própria pele se potencialize, sem cremes, sem injecções, só com técnica de massagem. Estamos a voltar ao fundamental – limpar a pele, fazer drenagem, tonificar os músculos. Já cheguei a cobrar 200 euros por uma massagem, estou a valorizar as minhas mãos. Há pessoas que pagam 400 ou 500 euros por um tratamento com uma máquina. As minhas mãos valem mais do que isso”, afirma.
A experiência como enfermeira fê-la partir em vantagem. Existe um conhecimento detalhado da fisiologia do rosto, essencial ao trabalho de um facialista. Hidratar, activar a circulação sanguínea e definir – o processo não é assim tão diferente de quando treinamos qualquer outra parte do corpo e Sarah já se habituou a ilustrar isso da forma mais clara possível. “Quando nutres o músculo, o músculo vai ficar mais definido. As pessoas dizem: a minha pele cai. A pele não cai, o que cai é o que está por baixo. Os músculos vão atrofiando ao longo do tempo, a pele é só um envelope. Quando as pessoas vêem o antes e o depois de uma massagem, vêem que ficam mais cheias e eu não fiz nada à pele. O músculo fica mais definido, vai engordar, a pele vai esticar. Uma vez que as pessoas percebem isto, muda totalmente a forma de perceber o rosto.”
Pela porta entram sobretudo pessoas que procuram uma alternativa à medicina estética invasiva – algumas ficam por aqui, outras acabam mesmo por combinar as duas. Dentro do estúdio, o poder das mãos é sagrado, seja de gua sha em riste ou na aplicação das muitas técnicas que aprendeu a dominar, como a massagem intrabucal, o método kobido (japonês) ou o Stretch & Lift (120€-150€), protocolo criado por Sarah, com acção simultaneamente estética e terapêutica. A facialista recomenda uma massagem a cada 15 dias, embora os resultados beneficiem mais do compromisso a longo prazo do que da frequência intensiva. Tudo, graças à memória muscular.
Do Leste, com amor
Não é preciso tocar à campainha nem entrar num elevador para chegar ao The Face Only. A porta está aberta desde o ano passado e o interior parece-se com um salão de cabeleireiro. Sem tesouras ou secadores, este espaço branco e minimal tem um extenso menu de massagens e tratamentos faciais. Entre mãos vigorosas e tecnologia pesada, o rosto é o centro de todas as atenções.
“O nível da estética em Portugal, digamos, não é muito alto. É uma área que ainda se está a desenvolver”, começa por afirmar Lena Bogacheva, uma das proprietárias do espaço, o primeiro na Europa de uma cadeia que teve origem na Rússia, mas que já se expandiu para a Arménia, Azerbeijão, Cazaquistão e, mais recentemente, para o Dubai. “Fui a um espaço, a outro, e percebi que tínhamos mesmo de abrir algo que tivesse a ver com estética. É um conceito que não existe. O que há são sobretudo clínicas, onde quem quiser fazer algo ao rosto terá de fazê-lo com um médico”, continua. “E nós não somos uma clínica”, esclarece Ilya Zakharevich, a outra metade da dupla que trouxe o The Face Only para Portugal. “Vir a um cosmetologista tem de ser fácil e agradável. Se envolve agulhas, injectáveis, cirurgias, não é connosco”, conclui.
Sem agulhas ou injectáveis, mas com maquinaria pesada. Na base dos tratamentos de rosto estão sempre as massagens manuais. A lista de opções foi pensada para que cada cliente monte a própria experiência, juntando dois ou três momentos, com os preços a oscilar entre os 12€ e os 250€. Depois das mãos, é quase sempre a tecnologia a entrar em acção. A Hydrafacial é uma delas, maquinão capaz de limpar a pele e hidratá-la ao mesmo tempo, tal como o Dermadrop, dispositivo de mesoterapia não invasiva e que Lena garante ser o primeiro da sua espécie a pisar solo nacional. Funciona com ar de alta pressão e com a aplicação de diferentes séruns, escolhidos em função da necessidade de cada pele. O rol continua – microcorrente, terapia com luz LED e, o aparelho mais pequeno de todos, estimulação biomecânica.
Num país onde a relação com a estética é um tanto ou quanto conservadora – pelo menos, foi o que lhes disseram –, o casal surpreendeu-se com o ritmo a que o conceito conquistou clientela portuguesa. Depois de ter atraído sobretudo estrangeiros a viver em Lisboa, nomeadamente americanos, britânicos, franceses e do leste europeu, os locais representam já 70% da carteira de clientes. “Os portugueses dizem-nos: ainda bem que trouxeram este conceito para cá, porque não sabemos como cuidar da nossa pele. E muitos passam várias vezes à porta, olham cá para dentro e umas semanas depois resolvem entrar. E uma vez cá dentro, recebem mais do que um tratamento, recebem uma experiência”, remata Lena.