“Ganhar ou Perder”: a nova série da Pixar que enxerga além do jogo

Uma abordagem inovadora que explora ansiedade, resiliência e identidade sob diferentes perspectivas dentro de um time de softbol

Mar 24, 2025 - 16:44
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“Ganhar ou Perder”: a nova série da Pixar que enxerga além do jogo

Ganhar ou Perder é a nova série original da Pixar Animation Studios que foi criada exclusivamente para o Disney+ e que aposta em um roteiro interessante onde a abordagem tem uma novidade: durante uma semana de intenso treinamento, cada um dos episódios da série é narrado do ponto de vista de um dos personagens. Todos estão em um time de softbol, o Pickles, que se prepara para o grande jogo do campeonato.

A série chegou na plataforma no final de fevereiro, com oito episódios onde temos uma visão bem ampla dos desafios e emoções enfrentados por jogadores, treinadores, pais e até mesmo árbitros. Essa abordagem permite explorar as motivações individuais e a dinâmica coletiva da equipe, destacando temas como trabalho em equipe, resiliência e a importância de enxergar além das próprias experiências. 

Ganhar ou Perder tem sido elogiada por sua narrativa inovadora e pela profundidade com que aborda as histórias pessoais dos personagens, alguns que têm contribuído para algumas polêmicas uma vez que a atriz trans, Chanel Stewart, é quem dubla a protagonista, Kai, cuja referência explícita à identidade de gênero acabou sendo omitida. 

A psicóloga Iara Mastine, especialista em Neuropsicologia e Psicologia Infanto-juvenil, conversou comigo depois de analisar a série, principalmente pensando em mães, pais e crianças e as questões delicadas que fazem parte da trama.

Quais os paralelos podemos traçar entre às histórias contadas em Ganhar ou Perder e desafios contemporâneos relacionados à temas atuais?

Achei a série extremamente relevante. Acredito que muitos psicólogos, professores, profissionais da área do desenvolvimento humano poderão encontrar várias oportunidades para criarem recursos terapêuticos e promover aprendizado e reflexão. Por exemplo, no episódio um, podemos correlacionar a temática com a ansiedade, em que a personagem demonstra, através das gotinhas de preocupação, o quanto a ansiedade atrapalha na tomada de decisões e na falta de um posicionamento assertivo.

A personagem ignora seus sentimentos, não se posicionando perante algumas situações pejorativas. A série mostra uma pessoa fazendo bullying com ela, expondo um vídeo dela e ela age como se estivesse tudo ok, agindo em desacordo com seus reais sentimentos. 

A possibilidade de ouvimos cada um dar sua versão, contribui para uma discussão mais aberta sobre temas mais sensíveis?

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Cada episódio traz algo específico que podemos relacionar com o desenvolvimento humano: observamos questões de bullying, de mentira, de dificuldades de dizer não, dificuldades de olhar para as necessidades e se posicionar de forma ética, traz a questão do ciúme, dos valores éticos, da insegurança, da pressão em não falhar e até sobre exposição em redes sociais.

Além das temáticas é possível relacionar padrões de comportamento dos personagens com possíveis transtorno do neurodesenvolvimento: transtorno de ansiedade, TDAH, necessidades de treinos de habilidades sociais, transtorno de conduta ou outros traços que podemos identificar nas personagens.

O que me encantou foi a forma como a série foi pensada, são 8 episódios que ocorrem simultaneamente na visão de personagens distintos. Uma mesma situação vivenciada por pessoas diferentes. Essa oportunidade em observar o mesmo contexto de diversas formas possibilita a compreensão de que cada pessoa possui suas necessidades, seus medos, suas inseguranças e julgamentos.

Série ganhar ou perder
‘Ganhar ou Perder’ aborda como as pessoas lidam com suas emoçõesPixar/Divulgação

O que a série pode ensinar a crianças, pais e profissionais da área da psicologia?

Como se trata de uma série, com capítulos curtos de aproximadamente 25 minutos, podemos fracionar o tempo promovendo planejamento (assistir um episódio por dia), criando oportunidades de vivenciar valores como paciência (assistir um por dia e esperar até o outro dia), fortalecer o vínculo familiar e a convivência. Esse movimento de assistir em família corrobora para a conexão familiar mais efetiva. Cada dia a família pode assistir aquele episódio e refletir sobre ele. 

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Nós, profissionais, podemos auxiliar as famílias com um guia de como aproveitar melhor os episódios, trazendo algumas perguntas específicas, onde eles podem correlacionar fatores, como “eu também fico preocupado, me sinto inseguro, mostro ser seguro demais, nunca sou bom o suficiente”. 

É comum, na terapia cognitivo comportamental, os psicólogos auxiliarem em atividades extras (além da sessão), como por exemplo auxiliar na “reunião familiar”, pois dessa maneira conseguimos envolver toda a família (já que o ambiente impacta diretamente no desenvolvimento da criança). Filmes, séries, livros são ótimos recursos para estender a terapia – não só durante as sessões a criança está se desenvolvendo, mas em muitos outros momentos com a utilização desses recursos. 

Como são episódios curtos e independentes, que se correlacionam através da mesma situação, a temática da série, por si só, facilita a compreensão da vivência e dos comportamentos de cada personagem. Mesmo porque, além de exemplificar as ações, a série consegue demonstrar o que cada personagem vivência dentro de si, através do desenho de pensamentos e ações (aquelas ações que não vemos, mas que impactam diretamente em suas decisões).

O que podemos aprender assistindo diferentes interpretações sobre um mesmo acontecimento e o que Ganhar ou Perder?

As diferentes vivencias do mesmo contexto mostradas na série ampliam a nossa visão e compreensão do que há por trás dos comportamentos.

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Essa temática proporciona a desvalorização do julgamento, conseguindo promover valores como aceitação, como respeito, como entender que para todo comportamento existe uma emoção e necessidade. 

Na terapia cognitivo comportamental entendemos que, o que o indivíduo pensa, ele sente, e de acordo com seus sentimentos, ele se comporta. Há um pensamento que gera essa emoção que propulsiona uma ação. 

Não adianta olhar somente para a ação, pois se o pensamento está disfuncional, esse pensamento pode interferir em diversas tomadas de decisão. Um exemplo é: o pensamento “eu não sou boa o suficiente” gera a emoção de insegurança e pode proporcionar a ação de esquiva. 

O indivíduo que pensa assim começa a se esquivar de diversas situações. Se olharmos somente para o comportamento de esquiva de uma única situação e promovermos um treino de enfrentamento, sem identificar o pensamento disfuncional, esse indivíduo pode até conseguir se posicionar em determinadas situações, porém ainda poderá se esquivar em outras, pois a crença de desvalia ainda está presente. 

É através do lúdico que conseguimos nos conectar com os pensamentos disfuncionais e as crenças das crianças. Sendo assim, até teorias mais profundas da psicologia, como compreender a terapia cognitivo comportamental, podemos exemplificar e utilizar através dessa série. 

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Eu tenho certeza a série Ganhar ou Perder despertará muito interesse nas famílias e profissionais quando compreenderem as diversas possibilidades de promover aprendizado, conexão e uma comunicação consciente entre os telespectadores. 

Cada personagem tem uma característica. Eu identifiquei personagens que apresentam traços de TDAH, que são extremamente curiosos, criativos, que podem se perder em suas ideias, apresentando dificuldade em fazer e manter amizades e ser compreendido. 

Podemos usar a serie para promover o treino de habilidades sociais, o encorajamento das ações, a valorização do autoconhecimento. Podemos focar em um personagem, como a Rochelle, que muitas vezes não consegue olhar os seus medos. Ela quer sempre resolver, ter uma ação e muitas vezes troca de papéis com a própria mãe (na visão dela). Com esse exemplo podemos trabalhar a aceitação e o acolhimento. 

Essa série é uma ferramenta já pronta para trabalhar diversos assuntos, valores e teorias da psicologia. Aproveitem!

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