Faixa a faixa: Conheça “Detrás da Serra”, segundo disco da Banda de Pífanos Caju Pinga Fogo

“Detrás da Serra” passa por ritmos como marcha, sambada, baião e forró. ”Esse álbum é um novo começo, ao mesmo tempo que é a junção dos anos de experiência”, explica Tauana Queiroz

May 5, 2025 - 03:28
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Faixa a faixa: Conheça “Detrás da Serra”, segundo disco da Banda de Pífanos Caju Pinga Fogo

por Diego Albuquerque

Após debutar com o álbum “Rosa dos Ventos” em 2019 (também comentado faixa a faixa aqui no Scream & Yell), lançar uma performance visual chamada “Sem Terreno” no ano seguinte, e na sequência um EP, “Pifo” (2022), com versões remixadas de músicas autorais, em parceria com produtores e DJs de diferentes estados do Brasil, a Banda de Pífanos Caju Pinga Fogo, criada em Teresina, no Piauí, em 2016, chega agora a seu segundo álbum cheio, “Detrás da Serra” (2025), fruto de uma vivência de uma semana em Petrolina, no sertão pernambucano, gravando no estúdio Casinha Lab, do engenheiro de áudio Iago Guimarães.

Detrás da Serra” apresenta 10 faixas que passam por ritmos como marcha, sambada, baião e forró. ”Esse álbum é um novo começo, ao mesmo tempo que é a junção dos anos de experiência que temos enquanto banda e troca com pessoas e público”, explica Tauana Queiroz, zabumbeira e uma das compositoras do grupo. “Ele inaugura uma visão sobre o que a gente quer propor para as pessoas”, salienta. “Ele vem num momento de mudança da banda, não apenas de integrantes, mas da nossa vivência com a música regional. São nove anos de banda, nosso olhar sobre os instrumentos estão mais maduros”, completa Javé Montuchô, responsável pelas caixas e tarol.

Ao longo de “Detrás da Serra” ouvimos sons de cortejo, comum às bandas de Pífano que circulam por feiras pelo interior do Brasil, samba de matuto, muito ligado a tradição do pífano e na percussão do álbum, além do tradicional baião e o forró, ritmos tão nordestinos e com forte presença na música brasileira. O disco ainda conta com uma canção da pifeira piauiense Joane Faustino e uma homenagem à João do Boi, mestre de samba chula do recôncavo baiano. Apoiado pelo Sistema de Incentivo Estadual à Cultura (SIEC – PI) e patrocinado pelo Armazém Paraíba, “Detrás da Serra” está disponível em todas as plataformas. Ouça e conheça o disco faixa a faixa!

01) “Ternim Dobrado” (Maguim do Pife e Leo Mesquita): Marcha que traz na sonoridade uma referência aos cortejos em mercados públicos, prática comum das bandas de pífano. Com sons captados na Feira da Areia Branca, em Petrolina (local por onde a banda circulou tocando e cantando), a faixa recepciona os ouvintes do álbum, convidando para uma imersão na Cultura do Pífano, mais especificamente no universo musical da Caju Pinga Fogo.

02) “Cocoricô” (Tauana Queiroz): A ideia para criação dessa música foi o acontecimento comum na vida de uma criança: uma queda. A letra brinca com o fato de a criança lidar de forma divertida com a situação, imitando um galo ao perceber o inchaço na testa após a pancada. A faixa traz a leveza e ludicidade da infância e faz um apelo para que mesmo depois de adultos, não deixemos de celebrar nossa criança. É um convite à brincadeira, à folia, a deixar-se emocionar como na infância.

03) “Baião Nas Alturas” (Joane Faustino): A música foi apresentada pela própria compositora em um ensaio da banda e logo foi inserida no repertório do álbum. Joane Faustino é pifeira e tem músicas lançadas em seu trabalho solo. “Baião nas Alturas” traz a força e leveza de um ritmo no nome. O arranjo dançante, feito em conjunto com a compositora, possui breques e mudanças sutis na execução da percussão, variando entre o baião tradicional e baião cabaçal, típico da cultura do pífano.

04) “Currupião” (Leo Mesquita e Maguim do Pife): Essa música é um samba composto em meio a devaneios e observações da natureza durante o período de quarentena da pandemia do COVID-19, especificamente no litoral do Piauí (Barra Grande). Leo Mesquita encontrou, na observação das aves, um refúgio poético, se encantando pela diversidade de espécies e a liberdade de seus cantos e voos, enquanto ele (o observador/ compositor) se encontrava preso em casa, como pássaro enjaulado, impedido de voar. Não podendo voar, cantou! E assim criou a melodia, observando um ‘Currupião’ que brincava livremente entre as folhas de uma palmeira próxima à sua janela, onde tocava o pífano e observava o horizonte. A grafia do nome, por escolha da banda, permaneceu da maneira como pronunciada, com a letra U.

05) “São Parnaíba” (Tauana Queiroz e Léo Mesquita): Essa faixa é originária de uma canção antiga, inédita, de Tauana Queiroz, que foi rearranjada com acréscimo de outros versos, durante o processo de gravação do álbum em Petrolina. É uma marcha que reverencia a importância do Velho Monge, o rio Parnaíba, que margeia a cidade de Teresina.

06) “Mestre João Do Boi (Sample)”: Sample que traz a cantoria de Mestre João do Boi, referência do samba chula do recôncavo baiano, que foi inspiração para a criação da faixa seguinte.

07) “Samba João Do Boi” (Maguim do Pife): Em uma viagem para tocar em Salvador (BA), a banda teve a oportunidade de presenciar uma apresentação do grupo de Samba Chula do Mestre João Do Boi. Enquanto o grupo se apresentava no palco, os pifeiros tocavam ao longe, improvisando e acompanhando suas músicas. Assim nasceu a primeira parte da melodia dessa música, adaptada para Samba Matuto, ritmo tradicional das bandas de pífanos.

08) “Pisando Barro” (Leo Mesquita e Maguim do Pife): Mais um samba, que vem para alegrar o álbum, falando da poesia e do forró que pisa o chão de barro, levanta a poeira e faz germinar sementes da cultura. Cultura essa que é o hábito de criar, procurar e dedicar tempo aos saberes do pífano. Para que seja possível a alegria rodopiando em um salão, é preciso música e para fazer música, é necessário treino, suor e dedicação de um tocador em seu fazer artístico. Essa música foi resultado de meses de estudo e inspiração no mestre João do Pife (Arapiraca-AL), considerado por muitos o Rei do Pífano e certamente a maior referência para composição desta música.

09) “Forró De Quem Se Quer” (Tauana Queiroz): Eis uma canção que leva a mensagem da diversidade no forró. A música foi composta por uma mulher lésbica, mãe, nordestina, que há dez anos vivencia o forró em sua vida artística. Abre possibilidade de diálogo para repensar os padrões impostos pela heteronormatividade nesse e em qualquer meio onde haja vivência das tradições da cultura popular. “Forró de quem se quer” festeja o amor entre pessoas que se amam, sejam elas quem forem!

10) “Detrás Da Serra” (Leo Mesquita e Tauana Queiroz): Música que dá nome ao álbum, foi composta semanas antes da gravação do álbum, como uma homenagem aos ritmos das bandas de pífanos tradicionais. Com o passar dos anos, o forró e o samba ficaram mais evidenciados nos repertórios das bandas de pífano, mas esta valsa vem pra nos lembrar a beleza e a riqueza em diversidade de ritmos que essas bandas tem! A letra fala do despertar cotidiano numa casa do interior, junto ao nascer do sol. É recomeço do dia, que anuncia a chegada de uma nova fase da Banda de Pífanos Caju Pinga Fogo.

– Diego Albuquerque é o criador do blog Hominis Canidae, um dos maiores repositórios de discos brasileiros da última década. O blog foi criado em 2009, no Recife, e divulga novos artistas e nomes indies da música brasileira, de norte a sul do país. A foto que abre o texto é de Jonathan Dourado / Divulgação