Três “comédias românticas” na Netflix: “História de Amor em Copenhague”, “Meio Grávida”, “A Lista da Minha Vida”
Em “História de Amor em Copenhague”, drama soterra o romance; “Meio Grávida” é comédia pastelão; “A Lista da Minha Vida” é odiável... e adorável.

texto de Marcelo Costa
“História de Amor em Copenhague”, de Ditte Hansen e Louise Mieritz (2025)
Eis uma situação corriqueira: você está procurando um filme em streaming sem querer saber muito da sinopse para evitar spoilers. A ideia é ver uma comédia romântica – um estilo que é puro spoiler, mas deixemos essa questão para outra ocasião – e, então, você se depara com o sugestivo título “História de Amor em Copenhague”, e a mente entende: “achei o que eu queria ver”. Porém, “Sult” (título original dinamarquês que significa “Fome”) não é bem aquilo que alguém que procura comédias românticas espera. Em menos de 10 minutos, Mia (Rosalinde Mynster) será apresentada como uma escritora pop de sucesso devoradora de adolescentes e com mínimo tato para relacionamentos sérios, mas que verá em Emil (Joachim Fjelstrup), um arqueólogo divorciado com dois filhos pequenos, o homem ideal para sua vida. Em cerca de 90 dos 95 minutos seguintes teremos um drama denso sobre um casal com dificuldades reprodutivas (epidemia moderna também presente na segunda temporada de “Ruptura” e no episódio “Pessoas Comuns”, da sétima temporada de “Black Mirror”) que vive o pacote completo da situação: de visitas a clínicas, contagem de espermatozoides e taxas de fertilidade a sexo programado, injeções, mudanças drásticas de humor e crises conjugais. Inspirado no romance autobiográfico “Sult”, de Tine Høeg, e com título internacional vertido para “A Copenhagen Love Story”, tanto autora quanto a dupla de diretoras (três mulheres desenhando uma mulher vivendo meses de violentos ataques de frustração e nervos) oferecem uma visão bastante intensa sobre esse pesadelo cruel da possibilidade de infertilidade. Perdido na tradução, o espectador pode até odiar o filme, ainda que exista sim uma história de amor em Copenhague aqui: você só terá de encontrá-la soterrada em meio aos destroços do terremoto proposto pelo livro/roteiro. Todo o drama, no entanto, sufoca o romance (e o espectador), independente de seu final. Mas isso é amor também… só não espere comicidade (nem confie nesses títulos pomposos que, na verdade, são bregas).
Nota: 7
“Meio Grávida”, de Tyler Spindel (2025)
Se o texto anterior deixou você levemente desconfiado, melhor tirarmos o elefante azul de bolinhas rosas de dentro da máquina de lavar roupas: “Kinda Pregnant” é realmente uma comédia pastelão, o que fica óbvio não apenas pela presença da divertida comediante Amy Schumer no elenco, mas principalmente porque ela assina a adaptação do roteiro ao lado de Julie Paiva, autora da história – e ainda marca presença como uma das produtoras. Na trama, o espectador é apresentado a Lainy Newton (Amy Schumer), uma professora cuja melhor amiga desde a infância, Kate (Jillian Bell), acaba de engravidar (assim como várias mulheres próximas de seu círculo social), sendo que ela acreditava que iria engravidar primeiro (ainda que se encontre, no momento, solteira). Por um acaso do destino (o acaso é um dos melhores ganchos para a comédia, diria Shakespeare, fã devoto desse estratagema), ela é flagrada por outra pessoa numa loja para futuras mamães usando uma falsa barriga de grávida, gosta do que se insinua ser uma brincadeira, e leva a farsa longe demais (envolvendo uma nova amiga, a velha parceira, um concorrente a novo amor, e um frango assado). Comédia (romântica) de erros com certo potencial, “Meio Grávida” tropeça em um milhão e meio de clichês e num elenco interessante atuando no automático (a direção de Tyler Spindel não colabora), crava umas três ou quatro piadinhas divertidas (algumas politicamente incorretas – há como fazer humor sendo politicamente correto? Pesquisar) em mais de 50 e não só parece bem bobinha e esquecível (ainda que simpática): realmente é mesmo.
Nota: 4
“A Lista da Minha Vida”, de Adam Brooks (2025)
Se você procura uma comédia romântica odiável de tão óbvia, mas com potencial para te conquistar mesmo com todos os seus clichês (ou exatamente devido a eles), esse é seu dia de sorte: eis “The Life List”, de Adam Brooks, um especialista no estilo, cujas credenciais exibem delicinhas como “Definitely, Maybe” (2008), promessas como “The Invisible Circus” (filme de 2001 com Cameron Diaz inspirado no livro de estreia de Jennifer Egan) e bobagens como “Wimbledon” (2004). Nessa história adaptada do romance homônimo de Lori Nelson Spielman, Brooks apresenta Alex (Sofia Carson), uma (pobre) moça (rica) novaiorquina classe média bem de vida que, não bastasse estar completamente sem rumo, acaba de perder a mãe. Na leitura do testamento, ao lado de seus dois irmãos e das duas cunhadas, em que espera receber a empresa da família, ela é surpreendida com um daqueles pedidos maternos que só acontecem em Hollywood, ops, na Netflix: a falecida não apenas passou seu cargo na empresa para uma das cunhadas como resgatou uma lista de “coisas que eu quero fazer quando crescer” de quando Alex tinha 13 anos, e só irá liberar sua parte no testamento quando Alex tiver cumprido todos os itens da lista. Besta, certo? Mas quer saber: funciona. Principalmente porque utiliza um recurso clássico da literatura: fazer o personagem rodar o mundo para descobrir que o que ele precisava estava exatamente embaixo do seu nariz no começo da história (Paulo Coelho usou o artificio em “O Alquimista” assim como Aldous Huxley em “O Macaco e a Essência”, dentre muitos outros). Em “A Lista da Minha Vida”, você descobrirá por quem Alex irá se apaixonar com alguns segundos de filme, irá vasculhar na memória para lembrar quem canta “That’s Not My Name”, se deliciará com uma trilha que conta com Spoon (“You Got Yr. Cherry Bomb”), Wet Leg (“Wet Dream”) e Billy Bragg com Wilco (“California Stars”), e corre o risco de filosofar quanto se tornou do eu que desejava ser quando criança. Vamos combinar: é bastante para uma comédia romântica odiável, certo?
Nota: 6
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.