Ética no design é inegociável?
Sobre “fazer o certo” — ou pelo menos tentar.Mihoko Takata“A ética também se estende à intenção de um projeto.Sem lisura de propósito não se pode considerá-lo aceitável ou desejável, apesar de quaisquer méritos de design que ele possa ter.”— Alice RawsthornEu sei, parece um título absurdo, né?“Claro que é inegociável, Gabriel. Pergunta boba.” — a voz na sua cabeça, assim que leu.E isso é ótimo. Mas também tem quem vai ler e pensar:“Hum, depende. Tão pagando quanto?”E, bom… faz parte do jogo.Independente disso, escrevo este texto pra te inspirar a enxergar o design como algo além do retorno financeiro, focado também num futuro melhor pra todo mundo, com transparência, humanidade e ética.A ética no design atualPra começar esse papo, tenho uma pergunta honesta: você já parou pra pensar se o que você tá criando é realmente certo? Ou talvez a pressa em lançar algo de sucesso te faz perder de vista o impacto que isso pode ter na vida das pessoas?Numa época em que tudo avança tão rápido, as regras e boas práticas de uso podem demorar pra acompanhar e, quando chegam, o estrago já foi feito.No fim, a responsabilidade de evitar problemas futuros na sociedade acaba caindo na gente, que trabalha com o design dessas soluções. Somos a linha de frente entre o desejo das empresas e as consequências em quem usa o que criamos. Ah, e fun fact: se a gente não ligar pra isso, dificilmente outras áreas da empresa vão.Rosanna Alam, da página Unboxed, resume como a ética se aplica ao design de produtos digitais. Segundo ela, podemos dividir nossa responsabilidade em duas partes:Baseada no dever: perguntar “esse problema vale mesmo a pena ser resolvido?”;Baseada nos resultados: pensar “quais serão as consequências dessa solução?”.Em resumo, qualquer solução tem que garantir três coisas pra quem tá usando:Autonomia: dar controle real, tipo permitir opt-in e opt-out nas configurações;Transparência: deixar claro desde o começo no que a pessoa tá se metendo;Segurança: proteger a privacidade, o bem-estar (emocional e físico) e garantir inclusão.Agora, trazendo as palavras de Rishithaveldurthy, temos 3 formas de incluir essa preocupação em nosso trabalho.1. Ensinando ética no design desde o começoAntes de aprender sobre regras, frameworks ou processos de UX, quem estuda design precisa entender onde fica o limite.Saber a diferença entre engajar e manipular é básico pra qualquer designer.2. Mudando a forma de medir sucessoA gente precisa parar de medir tudo só por retenção de usuários e lucro.As perguntas certas são: — Estamos realmente melhorando a vida das pessoas? — Os usuários estão criando hábitos saudáveis? — Eles confiam na gente?3. Criando pra dar autonomia, não pra viciarO design deve ajudar as pessoas, não prendê-las em ciclos viciantes.Se a gente fala tanto de empatia, então vamos usá-la pra ajudar as pessoas a tomar melhores decisões, aprender e ter mais equilíbrio.A pirâmide do Design ÉticoComplementando esse assunto, tem outro material que faz a gente refletir sobre o assunto e acredito que toda pessoa designer deve ter acesso.A ideia é da ind.ie, uma organização sem fins lucrativos que busca justiça social na era digital. Eles desenvolvem projetos que envolvem o que chamam de tecnologia ética, que respeita os direitos humanos, o esforço e a experiência das pessoas.Pra representar seus valores, a organização criou a Pirâmide do Design Ético e disponibilizaram pra toda a comunidade.Cada seção da pirâmide tem um propósito:Direitos HumanosTecnologia ética respeita os direitos humanos.Isso significa ser descentralizada, peer-to-peer, com criptografia de ponta a ponta, zero-knowledge, código aberto, acessível, sustentável e interoperável.Ela protege suas liberdades civis, reduz desigualdades e fortalece a democracia.Esforço HumanoTecnologia que respeita o esforço humano é funcional, prática e confiável.Ela é pensada para ser útil, não pra complicar sua vida. Não exige sua atenção o tempo todo, entende que você pode estar distraído ou ter necessidades diferentes e valoriza o tempo precioso que você tem.Experiência HumanaTecnologia que respeita a experiência humana é bonita, mágica e prazerosa de usar.Simplesmente funciona. É intuitiva, discreta e se encaixa na sua vida sem atrapalhar. Ela te dá autonomia, te surpreende de um jeito bom e deixa o seu dia melhor.Ou seja, se o seu produto só existe pra manipular dados, usar deceptive patterns e lucrar sem se importar com o impacto real nas pessoas e na sociedade, tem uma grande chance dele ser antiético.Cabe à pessoa designer pensar nos direitos humanos e garantir que seu produto esteja alinhado com valores éticos — ou o mais próximo disso.Pra gente fechar“Se não acharmos um equilíbrio entre empatia e engajamento, entre lucro e responsabilidade, corremos o risco de esquecer o verdadeiro propósito do design: servir as pessoas e a sociedade de forma significativa.”— RishithaveldurthyConfesso que ainda me sinto perdido quanto ao meu papel nos projetos comerciais que sou pago pra r

Sobre “fazer o certo” — ou pelo menos tentar.

“A ética também se estende à intenção de um projeto.
Sem lisura de propósito não se pode considerá-lo aceitável ou desejável, apesar de quaisquer méritos de design que ele possa ter.”
— Alice Rawsthorn
Eu sei, parece um título absurdo, né?
“Claro que é inegociável, Gabriel. Pergunta boba.” — a voz na sua cabeça, assim que leu.
E isso é ótimo. Mas também tem quem vai ler e pensar:
“Hum, depende. Tão pagando quanto?”
E, bom… faz parte do jogo.
Independente disso, escrevo este texto pra te inspirar a enxergar o design como algo além do retorno financeiro, focado também num futuro melhor pra todo mundo, com transparência, humanidade e ética.
A ética no design atual
Pra começar esse papo, tenho uma pergunta honesta: você já parou pra pensar se o que você tá criando é realmente certo? Ou talvez a pressa em lançar algo de sucesso te faz perder de vista o impacto que isso pode ter na vida das pessoas?
Numa época em que tudo avança tão rápido, as regras e boas práticas de uso podem demorar pra acompanhar e, quando chegam, o estrago já foi feito.
No fim, a responsabilidade de evitar problemas futuros na sociedade acaba caindo na gente, que trabalha com o design dessas soluções. Somos a linha de frente entre o desejo das empresas e as consequências em quem usa o que criamos. Ah, e fun fact: se a gente não ligar pra isso, dificilmente outras áreas da empresa vão.
Rosanna Alam, da página Unboxed, resume como a ética se aplica ao design de produtos digitais. Segundo ela, podemos dividir nossa responsabilidade em duas partes:
- Baseada no dever: perguntar “esse problema vale mesmo a pena ser resolvido?”;
- Baseada nos resultados: pensar “quais serão as consequências dessa solução?”.
Em resumo, qualquer solução tem que garantir três coisas pra quem tá usando:
- Autonomia: dar controle real, tipo permitir opt-in e opt-out nas configurações;
- Transparência: deixar claro desde o começo no que a pessoa tá se metendo;
- Segurança: proteger a privacidade, o bem-estar (emocional e físico) e garantir inclusão.
Agora, trazendo as palavras de Rishithaveldurthy, temos 3 formas de incluir essa preocupação em nosso trabalho.
1. Ensinando ética no design desde o começo
Antes de aprender sobre regras, frameworks ou processos de UX, quem estuda design precisa entender onde fica o limite.
Saber a diferença entre engajar e manipular é básico pra qualquer designer.
2. Mudando a forma de medir sucesso
A gente precisa parar de medir tudo só por retenção de usuários e lucro.
As perguntas certas são:
— Estamos realmente melhorando a vida das pessoas?
— Os usuários estão criando hábitos saudáveis?
— Eles confiam na gente?
3. Criando pra dar autonomia, não pra viciar
O design deve ajudar as pessoas, não prendê-las em ciclos viciantes.
Se a gente fala tanto de empatia, então vamos usá-la pra ajudar as pessoas a tomar melhores decisões, aprender e ter mais equilíbrio.
A pirâmide do Design Ético
Complementando esse assunto, tem outro material que faz a gente refletir sobre o assunto e acredito que toda pessoa designer deve ter acesso.
A ideia é da ind.ie, uma organização sem fins lucrativos que busca justiça social na era digital. Eles desenvolvem projetos que envolvem o que chamam de tecnologia ética, que respeita os direitos humanos, o esforço e a experiência das pessoas.
Pra representar seus valores, a organização criou a Pirâmide do Design Ético e disponibilizaram pra toda a comunidade.
Cada seção da pirâmide tem um propósito:
Direitos Humanos
Tecnologia ética respeita os direitos humanos.
Isso significa ser descentralizada, peer-to-peer, com criptografia de ponta a ponta, zero-knowledge, código aberto, acessível, sustentável e interoperável.
Ela protege suas liberdades civis, reduz desigualdades e fortalece a democracia.
Esforço Humano
Tecnologia que respeita o esforço humano é funcional, prática e confiável.
Ela é pensada para ser útil, não pra complicar sua vida. Não exige sua atenção o tempo todo, entende que você pode estar distraído ou ter necessidades diferentes e valoriza o tempo precioso que você tem.
Experiência Humana
Tecnologia que respeita a experiência humana é bonita, mágica e prazerosa de usar.
Simplesmente funciona. É intuitiva, discreta e se encaixa na sua vida sem atrapalhar. Ela te dá autonomia, te surpreende de um jeito bom e deixa o seu dia melhor.
Ou seja, se o seu produto só existe pra manipular dados, usar deceptive patterns e lucrar sem se importar com o impacto real nas pessoas e na sociedade, tem uma grande chance dele ser antiético.
Cabe à pessoa designer pensar nos direitos humanos e garantir que seu produto esteja alinhado com valores éticos — ou o mais próximo disso.
Pra gente fechar
“Se não acharmos um equilíbrio entre empatia e engajamento, entre lucro e responsabilidade, corremos o risco de esquecer o verdadeiro propósito do design: servir as pessoas e a sociedade de forma significativa.”
— Rishithaveldurthy
Confesso que ainda me sinto perdido quanto ao meu papel nos projetos comerciais que sou pago pra representar. O design deve fazer o bem, ser justo e prezar pela ética, não só trazer dinheiro. E sim, é difícil juntar todas essas coisas num projeto só no contexto atual.
Nosso desafio como geração de pessoas que fazem design é desconstruir muitos desses estigmas do que chamamos de progresso. O dinheiro move o mundo, e hoje nosso design só tem valor se mover o dinheiro. Infelizmente, como já disse, faz parte do jogo.
Mas isso não nos impede de seguir estudando e direcionando nosso trabalho pra onde queremos. Nossas atitudes como designers, ainda que pontuais, já entram na conta positivamente.
Inclusive, queria trazer aqui uma passagem de Katerine McCoy que resume muito bem a intenção que tenho ao escrever meus textos:
“Acho que o que tenho em mente é nutrir uma safra de cidadãos ativos — participantes informados e preocupados com a sociedade que por acaso são designers.
Devemos parar de treinar os nossos alunos [de design] a ignorarem as suas convicções e serem servidores econômicos passivos.
Em vez disso, devemos ajudá-los a clarificar os seus valores pessoais e dar-lhes as ferramentas necessárias para reconhecerem quando é apropriado agir de acordo com eles.
Eu acredito que isso é possível.”
Seguimos fazendo nossa microparte pra que alguma microcoisa no mundo mude, certo? Nosso futuro depende de nosso posicionamento.
E conto com você nessa ✊
Referências
- Design como atitude, de Alice Rawsthorn.
- Design ethics: the importance of ‘doing right’ by your users, de Rosanna Alam.
- On Design Ethics, Climate Change and Victor Papanek’s “Design for the Real World”, de Elena Poritskaia.
- Ethical Design Movement.
- Rethinking the purpose of UX design in the era of digital addictions, de
Rishithaveldurthy. - Tecnologia persuasiva: Será que somos ratos de laboratório?, de Filipe Nzongo.
Ética no design é inegociável? was originally published in UX Collective