Que história o seu produto está contando?

Porque pensar em storytelling pode mudar como você projeta produtos.Foto de ibmoon Kim na UnsplashSempre fui uma grande fã de jogos, sejam eletrônicos ou de tabuleiro.Claro que jogabilidade e desafios são partes indispensáveis de um bom jogo, mas tem algo que sempre me prende como mágica: uma boa história.São elas que me fazem desacelerar e me reconectar, me tiram da avalanche de informações rápidas e superficiais do mundo moderno e me levam para um lugar mais significativo. O mesmo acontece com um bom livro, filme ou até em uma envolvente conversa com amigos. Por trás de tudo isso, há uma boa trama sendo contada e por trás dela, um elo emocional que nos conecta enquanto humanos.Ao criar experiências, também estamos contando histórias.O storytelling — ou a narrativa — integrada a um produto ou serviço tem o poder de gerar um envolvimento genuíno com quem o utiliza. Em um mercado saturado, a habilidade de engajar por meio de narrativas não apenas humaniza o produto, mas também o torna mais memorável, relevante e competitivo.­PersonagensGosto de pensar nos nossos usuários como protagonistas da história que estamos construindo. Muitos enredos começam com os personagens entrando em cena e revelando suas personalidades e objetivos. O mesmo vale para o Design de experiência: quanto mais entendermos como pensam, o que sentem e como veem o mundo, mais perto estaremos de criar narrativas nas quais eles realmente queiram viver.Nas melhores histórias, os personagens têm camadas (nem sempre tão evidentes), moldadas por vivências, medos e desejos profundos. São esses aspectos, somados a fatores externos, que influenciam suas ações e a forma como se relacionam com o mundo.Uma ferramenta poderosa para entender mais a fundo seus usuários nesse sentido é a abordagem Jobs to be Done (JTBD). Ela permite que possamos compreender com profundidade todos os aspectos funcionais, emocionais e contextuais da contratação e uso de um produto.Por exemplo:Você pode imaginar que uma pessoa use serviços de streaming para assistir a um bom filme com a família numa sexta à noite, motivada pelo desejo de relaxar, se distrair e se entreter. Mas, na prática, ela pode estar usando o streaming por um motivo bem diferente: gosta de deixar um programa de TV rolando enquanto limpa a casa, porque sente que o silêncio a incomoda.Nesse caso, a motivação real é preencher o ambiente, sentir companhia e deixar a casa mais aconchegante durante tarefas do dia a dia. E, nesse cenário, o verdadeiro concorrente pode não ser outro serviço de vídeo, mas talvez um podcast.Além disso, aplicar a base JTBD nos ajuda a mapear o percurso do usuário para chegar no seu produto. De forma similar a um arco narrativo, na qual a personagem passa por eventos para chegar ao clímax — o ato de virada da trama — seu usuário também vai chegar ao seu produto após passar por alguns conflitos, envolvidos de frustrações de tentativas anteriores de alcançar soluções. É importante que como designer, reconheçamos esse momento de virada para conduzir de forma mais estratégica o usuário de um ponto A a um ponto B.­JornadaEm O Design como Storytelling, Ellen Lupton propõe uma reflexão sobre a ideia de que o design se resume à “resolução de problemas”. Para a autora:O design vai além da funcionalidade; ele expressa valores mais profundos, conectados à emoção, à sensação e à percepção.Trata-se, acima de tudo, de uma troca de energia entre quem cria e quem vivencia a experiência.Como designers, é comum utilizarmos mapas e jornadas para visualizar toda a trajetória do usuário e compreender as expectativas envolvidas em cada interação. Essas ferramentas são extremamente valiosas para construir experiências usando uma perspectiva de storytelling, pois revelam oportunidades de encantar usuários e, assim, gerar vantagens competitivas por meio de soluções centradas no usuário — além de ajudar a identificar processos desnecessários para o negócio.Assim como em uma boa narrativa, com início, meio e fim, precisamos desenhar jornadas que antecipem expectativas e explorem possibilidades de entrega de valor em todos os pontos de contato. Cada etapa tem um papel fundamental. Do primeiro contato ao pós-venda, cada momento contribui para construir (ou comprometer) a conexão do usuário com o produto.Exemplo de jornada de uma pessoa indo a um restaurante, retirado do livro Building Great Customer Experiences de Colin Shaw e John Ivens­ImpactoNo fim, as pessoas querem ser tratadas como protagonistas das próprias histórias, e com razão. Cada busca, cada decisão de compra carrega um desejo por transformação. Quando reconhecemos isso e projetamos experiências com essa intenção, deixamos de oferecer apenas um produto e passamos a oferecer um papel real na vida delas.O verdadeiro impacto de um produto não está só no que ele entrega, mas em como ele transforma quem o utiliza.O Pinterest, à primeira vista, parece apenas uma grade infinita de imagens. As pessoas o usam para buscar inspiração e dar novos significados

May 6, 2025 - 12:52
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Que história o seu produto está contando?

Porque pensar em storytelling pode mudar como você projeta produtos.

Close-up de um tabuleiro de jogo de estratégia com peças de madeira, cilindros coloridos e uma peça com formato de uma figura humana com bandeira sobre uma área verde do tabuleiro, enquanto o fundo está desfocado.
Foto de ibmoon Kim na Unsplash

Sempre fui uma grande fã de jogos, sejam eletrônicos ou de tabuleiro.

Claro que jogabilidade e desafios são partes indispensáveis de um bom jogo, mas tem algo que sempre me prende como mágica: uma boa história.

São elas que me fazem desacelerar e me reconectar, me tiram da avalanche de informações rápidas e superficiais do mundo moderno e me levam para um lugar mais significativo. O mesmo acontece com um bom livro, filme ou até em uma envolvente conversa com amigos. Por trás de tudo isso, há uma boa trama sendo contada e por trás dela, um elo emocional que nos conecta enquanto humanos.

Ao criar experiências, também estamos contando histórias.

O storytelling — ou a narrativa — integrada a um produto ou serviço tem o poder de gerar um envolvimento genuíno com quem o utiliza. Em um mercado saturado, a habilidade de engajar por meio de narrativas não apenas humaniza o produto, mas também o torna mais memorável, relevante e competitivo.

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Personagens

Gosto de pensar nos nossos usuários como protagonistas da história que estamos construindo. Muitos enredos começam com os personagens entrando em cena e revelando suas personalidades e objetivos. O mesmo vale para o Design de experiência: quanto mais entendermos como pensam, o que sentem e como veem o mundo, mais perto estaremos de criar narrativas nas quais eles realmente queiram viver.

Nas melhores histórias, os personagens têm camadas (nem sempre tão evidentes), moldadas por vivências, medos e desejos profundos. São esses aspectos, somados a fatores externos, que influenciam suas ações e a forma como se relacionam com o mundo.

Uma ferramenta poderosa para entender mais a fundo seus usuários nesse sentido é a abordagem Jobs to be Done (JTBD). Ela permite que possamos compreender com profundidade todos os aspectos funcionais, emocionais e contextuais da contratação e uso de um produto.

Por exemplo:

Você pode imaginar que uma pessoa use serviços de streaming para assistir a um bom filme com a família numa sexta à noite, motivada pelo desejo de relaxar, se distrair e se entreter. Mas, na prática, ela pode estar usando o streaming por um motivo bem diferente: gosta de deixar um programa de TV rolando enquanto limpa a casa, porque sente que o silêncio a incomoda.

Nesse caso, a motivação real é preencher o ambiente, sentir companhia e deixar a casa mais aconchegante durante tarefas do dia a dia. E, nesse cenário, o verdadeiro concorrente pode não ser outro serviço de vídeo, mas talvez um podcast.

Além disso, aplicar a base JTBD nos ajuda a mapear o percurso do usuário para chegar no seu produto. De forma similar a um arco narrativo, na qual a personagem passa por eventos para chegar ao clímax — o ato de virada da trama — seu usuário também vai chegar ao seu produto após passar por alguns conflitos, envolvidos de frustrações de tentativas anteriores de alcançar soluções. É importante que como designer, reconheçamos esse momento de virada para conduzir de forma mais estratégica o usuário de um ponto A a um ponto B.

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Jornada

Em O Design como Storytelling, Ellen Lupton propõe uma reflexão sobre a ideia de que o design se resume à “resolução de problemas”. Para a autora:

O design vai além da funcionalidade; ele expressa valores mais profundos, conectados à emoção, à sensação e à percepção.

Trata-se, acima de tudo, de uma troca de energia entre quem cria e quem vivencia a experiência.

Como designers, é comum utilizarmos mapas e jornadas para visualizar toda a trajetória do usuário e compreender as expectativas envolvidas em cada interação. Essas ferramentas são extremamente valiosas para construir experiências usando uma perspectiva de storytelling, pois revelam oportunidades de encantar usuários e, assim, gerar vantagens competitivas por meio de soluções centradas no usuário — além de ajudar a identificar processos desnecessários para o negócio.

Assim como em uma boa narrativa, com início, meio e fim, precisamos desenhar jornadas que antecipem expectativas e explorem possibilidades de entrega de valor em todos os pontos de contato. Cada etapa tem um papel fundamental. Do primeiro contato ao pós-venda, cada momento contribui para construir (ou comprometer) a conexão do usuário com o produto.

Tabela intitulada “Mapa do momento” baseada no livro Building Great Customer Experiences de Colin Shaw e John Ivens. A tabela mostra a jornada do cliente em um restaurante, dividida em sete etapas: Reserva, Espaço em branco, Percurso, Chegar ao estacionamento, Entrar no restaurante e Fazer pedido. Para cada etapa, são listadas as expectativas, ameaças, oportunidades para exceder expectativas físicas e emocionais, e a emoção despertada.
Exemplo de jornada de uma pessoa indo a um restaurante, retirado do livro Building Great Customer Experiences de Colin Shaw e John Ivens

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Impacto

No fim, as pessoas querem ser tratadas como protagonistas das próprias histórias, e com razão. Cada busca, cada decisão de compra carrega um desejo por transformação. Quando reconhecemos isso e projetamos experiências com essa intenção, deixamos de oferecer apenas um produto e passamos a oferecer um papel real na vida delas.

O verdadeiro impacto de um produto não está só no que ele entrega, mas em como ele transforma quem o utiliza.

O Pinterest, à primeira vista, parece apenas uma grade infinita de imagens. As pessoas o usam para buscar inspiração e dar novos significados à própria vida. Seja repensando a decoração da sala, buscando ideias para um projeto criativo ou escolhendo o corte de cabelo ideal.

Ao entender essas intenções, o Pinterest entrega resultados personalizados com uma riqueza de referências que faz o usuário pensar: “Isso foi feito pra mim.” Esse senso de identificação não só melhora a experiência, como fortalece a conexão emocional com o produto. O produto deixa de ser uma grade de imagens e passa a fornecer a transformação do usuário: A segurança de mudar.

Telas de um aplicativo de busca de imagens (Pinterest). À esquerda, uma tela de busca por “butterfly haircut”, com filtros por tipo de cabelo (liso, crespo, cacheado, ondulado) e comprimento (long hair). Abaixo dos filtros, aparecem resultados de imagens de cortes de cabelo. À direita, uma tela de introdução ao recurso: “Uma nova forma de pesquisar ideias para cabelo”, com um fundo laranja e rosa e fotos de pessoas com diferentes tipos de cabelo. O texto explica que a ferramenta usa IA.
Detalhes na busca do Pinterest oferece apoio no desejo de mudança na identidade visual do usuário

Mesmo que uma empresa seja muito pequena, ela ainda é uma agente transformadora, capaz de empoderar pessoas em algum recorte de suas vidas. No fim das contas, estamos entregando meios para que esses protagonistas contem suas próprias histórias.

Ter essa perspectiva nos ajuda a entender que tudo o que oferecemos e projetamos se transforma em experiências. Algumas memoráveis, outras nem tanto.

E quanto ao seu produto? Ele está contando uma história boa ou ruim?

Referências

  • Muito Além da Sorte: Processos Inovadores para Entender o que os Clientes Querem — Clayton Christensen, Taddy Hall, Karen Dillon, David Duncan
  • O Design como Storytelling — Ellen Lupton
  • Building Great Customer Experiences — Colin Shaw, John Ivens
  • Mapeamento de Experiências — Jim Kalbach

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Que história o seu produto está contando? was originally published in UX Collective