Oscar 2025: a temporada mais indefinida de premiações está prestes a acabar e é inútil ter certeza
O sprint final desta maratona de premiações dá a “Conclave” um ligeiro favoritismo, especialmente por conta da vitória no Sindicato de Atores, a categoria com maior número de profissionais dentre os membros da Academia que organiza o Oscar.

texto de Alexandre Inagaki
Quando um filme inicia a temporada de premiações logo com a Palma de Ouro no Festival de Cannes, e depois acumula outras conquistas como os prêmios principais do Sindicato dos Produtores, do Sindicato dos Diretores, do Critics’ Choice Awards, do Spirit Awards e do Sindicato dos Roteiristas na categoria de Melhor Roteiro Original, deveria ser considerado o favorito absoluto para vencer também o Oscar de Melhor Filme, certo?
Sim, só que não. Afinal, como bem diria Jean-Paul Sartre naquela frase clássica posteriormente citada por Humberto Gessinger em “Infinita Highway”, a dúvida é o preço da pureza.
Estamos falando da temporada mais caótica do Oscar em décadas. “Anora” arrebatou todos os prêmios elencados no primeiro parágrafo e caminhava a passos largos para a consagração do anticonto de fadas escrito, dirigido e editado por Sean Baker. Mas então, justo na reta final da corrida para o Oscar, “Conclave” surpreendeu e conquistou as duas premiações mais relevantes que ainda restavam: as estatuetas de Melhor Filme no BAFTA e de Melhor Elenco no SAG Awards.
“Conclave”, embora concorra a 8 categorias no Oscar 2025, não teve Edward Berger indicado na categoria de Melhor Direção. Isso poderia soar fatal para suas chances de ganhar o prêmio de Melhor Filme, mas retrospectos recentes mostram que não é bem assim. Em 2022, “CODA – No Ritmo do Coração” foi o grande vencedor apesar de sua diretora Sian Heder ter sido esnobada na categoria (Jane Campion, por “Ataque dos Cães”, levou o Oscar de Melhor Direção). Em 2019, “Green Book” ganhou Melhor Filme enquanto seu diretor Peter Farrelly foi esquecido no rolê e Alfonso Cuarón venceu um justíssimo Oscar por seu trabalho em “Roma”. E tivemos ainda 2013, quando “Argo” ganhou a despeito de Ben Affleck não ter sido indicado na categoria que foi vencida por Ang Lee (“A Vida de Pi”).
Mas não vamos esquecer de “O Brutalista”: o épico de quase 3 horas e meia de duração rendeu ao cineasta Brady Corbet os prêmios de Melhor Direção no BAFTA, Globo de Ouro e Festival de Veneza, além de 10 indicações ao Oscar 2025 e o prêmio de Melhor Filme de Drama no Globo de Ouro.
O sprint final desta maratona de premiações dá a “Conclave” um ligeiro favoritismo, especialmente por conta da vitória no Sindicato de Atores, a categoria com maior número de profissionais dentre os membros da Academia que organiza o Oscar. Porém, entretanto, todavia, o páreo com “Anora” será duríssimo. E, se eventualmente a abertura do envelope mais aguardado da noite revelar o nome de “O Brutalista”, não será de todo surpreendente. Zebra mesmo será se qualquer um dos outros 7 indicados levar o Oscar de Melhor Filme, incluindo aí o nosso “Ainda Estou Aqui”.
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E por falar no filme protagonizado por Fernanda Torres, como andam suas chances nesta reta final?
Vamos ser realistas: a estatueta de Melhor Filme para “Ainda Estou Aqui”, embora não seja impossível, é altamente improvável. A não ser que ocorra um plot twist digno das reviravoltas de “Conclave”, o filme, de fato já foi uma imensa vitória ver um longa falado em português representar o Brasil na principal categoria do Oscar.
Sobre a estatueta que está mais ao nosso alcance, de Melhor Filme Internacional, “Ainda Estou Aqui” permanece como favorito em todos os sites especializados: Variety, Gold Derby, EW, Indiewire. Testemunhamos “Emilia Pérez” ganhar nesta categoria nas principais premiações pré-Oscar, como Globo de Ouro, Critics’ Choice Awards e BAFTA, mas o fato é que “Ainda Estou Aqui” chega ao término desta corrida em alta, com críticas entusiasmadas por todo o mundo. O Brasil nunca esteve tão próximo de vencer seu primeiro Oscar. E será uma conquista atrasada, mas justamente merecida, do país que legou ao mundo cineastas do porte de Glauber Rocha, Eduardo Coutinho, Cacá Diegues, Joaquim Pedro de Andrade e Suzana Amaral.
E Fernanda Torres, conquistará a estatueta de Melhor Atriz? Digamos que, aqui, Fernanda corre por fora do mesmo modo que “O Brutalista” em meio ao embate entre “Anora” e “Conclave” pelo Oscar de Melhor Filme. Demi Moore, vencedora do SAG Awards, do Globo de Ouro e do Critics’ Choice, é a grande favorita. Não só pela sua ótima performance em “A Substância”, mas também por toda a sua trajetória e a sua narrativa de uma atriz veterana que pela primeira vez recebe também o reconhecimento da crítica e das premiações cinematográficas.
E, do outro lado, temos a revelação Mikey Madison, vencedora do BAFTA. Que, em “Anora”, entregou uma atuação magneticamente estelar: ela grita, chora, gargalha, seduz e, ao final, estraçalha nossos corações.
Mas, em meio a uma concorrência tão acirrada, e lembrando que nesta categoria o Oscar sequer indicou outras atuações incensadas pela crítica, de atrizes do naipe de Nicole Kidman, Angelina Jolie, Tilda Swinton, Amy Adams e Saoirse Ronan, não posso deixar de dizer que Fernanda Torres entregou a performance do ano ao personificar Eunice Paiva. A cena da sorveteria talvez seja a que melhor sintetiza sua arte: uma aula de contenção (e tensão) dramática, em que tudo é dito através de gestos e olhares.
Não, Fernanda não é a favorita. Nunca um Oscar de Melhor Atriz foi dado a uma atuação que sequer recebeu indicação nos SAG Awards, no BAFTA e no Critics’ Choice. Se a brasileira vencer, por um filme falado em português, será um feito sem quaisquer precedentes na história do Oscar. Mas, hey, estamos falando da primeira atriz brasileira que venceu o Globo de Ouro de Melhor Atriz. Se há alguém capaz de quebrar mais este paradigma, é ela.
Se Fernanda vencer o Oscar, será uma surpresa maravilhosa que transformará todo o Brasil em Seltons Mellos gritando de felicidade como ocorreu no Globo de Ouro. Não vamos alimentar expectativas porque elas já estão suficientemente obesas; recomendo manter pés no chão e os olhos voltados para o céu, na expectativa de que alguma estrela cadente rasgue a noite e nos conceda esse grande desejo.
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P.S. 1: Outro país que mergulhou de cabeça na expectativa por conquistar seu primeiro Oscar é a Letônia. Uma nação europeia que tem menos de 2 milhões de habitantes, e que fez de “Flow”, produção indicada nas categorias de Melhor Filme Internacional e Melhor Longa de Animação, um orgulho nacional. O gato que protagoniza “Flow” ganhou estátua na capital letã, o Globo de Ouro que recebeu na categoria de melhor animação esteve em exposição no Museu Nacional de Arte atraindo milhares de visitantes e o diretor Gints Zilbalodis foi eleito o Cidadão do Ano de Riga, a capital da Letônia.
Toda essa comoção é outra prova do quanto o Oscar é uma premiação que mobiliza multidões mundo afora. E também da força do soft power da economia criativa. Quantas pessoas que lêem o Scream & Yell conhecem alguma coisa da Letônia? Eu, por exemplo, admito que não sabia praticamente nada antes das indicações de “Flow”. Só não era absolutamente ignorante da cultura letã porque, na condição de espectador fiel da Eurovision (assunto das minhas próximas colunas por aqui), acompanho anualmente as participações da Letônia, que venceu a edição de 2002 com “I Wanna” (cantada por Marie N) e, ano passado, se classificou para a final, após 7 anos de desclassificações, graças à interpretação emocionada (e emocionante) de Dons, que cantou “Hollow”.
P.S. 2: Desde 2012, costumo divulgar os meus palpites dos vencedores do Oscar. Naquele ano, acertei 19 vencedores. O ano em que fui mais certeiro foi 2014, quando cravei 21 dos 24 palpites. No ano passado, acertei 17 de 23 (a quantidade de categorias diminuiu em 2021, quando as categorias de Mixagem de Som e Edição de Som foram unificadas).
Acho improvável conseguir bater o meu recorde pessoal de acertos, porque quaisquer previsões nesta temporada tão atribulada serão muito temerárias. Mas, como tradição é tradição, seguem abaixo os meus palpites para os ganhadores do Oscar 2025 (lembrando: não são necessariamente meus candidatos favoritos, e sim aqueles que eu creio que levarão cada estatueta):
Melhor Filme: “Conclave”
Melhor Direção: Sean Baker (“Anora”)
Melhor Atriz: Demi Moore (“A Substância”)
Melhor Ator: Timothée Chamalet (“Um Completo Desconhecido”)
Melhor Roteiro Original: “Anora”
Melhor Roteiro Adaptado: “Conclave”
Melhor Atriz Coadjuvante: Zoe Saldaña (“Emilia Pérez”)
Melhor Ator Coadjuvante: Kieran Culkin (“A Verdadeira Dor”)
Melhor Filme Internacional: “Ainda Estou Aqui”
Melhor Edição: “Conclave”
Melhor Fotografia: “O Brutalista”
Melhor Figurino: “Wicked”
Melhor Maquiagem e Cabelo: “A Substância”
Melhor Design de Produção: “Wicked”
Melhor Trilha Sonora: “O Brutalista”
Melhor Canção Original: “El Mal” (“Emilia Pérez”)
Melhor Som: “Duna: Parte 2”
Melhores Efeitos Visuais: “Duna: Parte 2”
Melhor Longa de Animação: “Flow”
Melhor Documentário: ”No Other Land”
Melhor Curta-Metragem: “The Man Who Could Not Remain Silent”
Melhor Curta-Metragem de Animação: “Wander to Wonder”
Melhor Curta-Metragem de Documentário: “I Am Ready, Warden”
– Alexandre Inagaki é jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero, e consultor de mídias sociais. Já escreveu para a Rolling Stone Brasil, Trip e foi responsável pela criação e planejamento de campanhas online para Coca-Cola, Sony Pictures, entre outros. É curador da Campus Party e youPIX Festival. Publica textos na internet desde 1999. Começou em blogs coletivos e em seu próprio e-zine, chamado SpamZine. Além do Pensar Enlouquece, também foi um dos criadores do InterNey Blogs, um portal brasileiro de blogs. (linktr.ee/alexandreinagaki)