Criatividade, garimpo e arte: conheça o lar de Isabela Raposeiras
A empresária, dona do Coffee Lab, não tem medo de mudar! Em seu quadragésimo lar, ela celebra um décor cheio de autenticidade

Mudar de casa é abrir as portas para o novo — e, ainda assim, uma tarefa extenuante. Imagine fazer isso exatas 40 vezes. Ao longo de seus 51 anos, esse foi o número de ocasiões em que Isabela Raposeiras trocou de moradia. Vinda de um lar com uma filosofia de vida desprendida, a empresária criou logo cedo essa veia desbravadora, sem temer o novo.
Nascida no Rio de Janeiro e criada entre Brasília e Porto Alegre, ela conta que vem de uma família inquieta: seu pai morava num veleiro, e a mãe, rodeada pela natureza. “A tendência dos primos, dessa galera da minha geração, foi de ficar mais fixa em um lugar. Mas não foi o que aconteceu comigo e com a minha irmã. A gente continua andando, sabe? E definitivamente essa não é a minha última casa… provavelmente”, conta enquanto acende um charuto, um de seus hobbies favoritos, na extensa varanda de seu lar atual.

Apesar da alma nômade, é justamente aqui onde ela mantém as raízes que fazem contraponto com tantas mudanças. “Eu precisava de céu e de chão”, confessa, justificando a troca do apartamento antigo pelo sobrado com jardim e vista para as árvores — um raro refúgio natural na capital paulista. A busca por um espaço que lhe proporcionasse contato com o verde, algo que a acompanhou desde a infância, foi crucial na decisão.
Moradora de São Paulo desde 2000, cidade que escolheu para se fixar através dos negócios — ela é dona do Coffee Lab, eleita a melhor cafeteria da cidade por diversas vezes —, Isabela está há menos de um ano morando no novo endereço.
Em pouco tempo, o espaço já tem cara de lar. Paredes foram quebradas, quadros foram pregados, plantas cultivadas, tapetes posicionados e muitos móveis inseridos. É só assim, quando a residência fica com cara de casa, que ela consegue, finalmente, respirar.

“Se o espaço não estiver harmônico, do jeito que faz sentido pra mim, é como se eu não conseguisse viver” Isabela Raposeiras
“O ambiente é muito importante, parece que me ancora. Se o espaço não estiver harmônico, do jeito que faz sentido pra mim, é como se eu não conseguisse viver. Não me recarrego, não consigo.” Isabela acredita ter puxado esse olhar apurado principalmente da mãe, que não é arquiteta, mas sempre teve um dom especial para a decoração.
Resgate do passado
De olhar apurado, Isabela é especialista em criar cantinhos. Quando tinha 12 anos de idade, ela mesma fez um desenho de como queria o próprio quarto — seu primeiro projeto. Foi construindo pequenos ambientes, setorizando os pedaços do seu lar como um grande quebra-cabeça, que ela conquistou a façanha de morar num espaço preenchido por um aconchego que parece ter levado anos para ser construído.
“Eu detesto lugares que têm cara de showroom. Tá tudo muito parecido, né? As aparências, os estilos. As pessoas estão ficando iguais, as casas estão ficando datadas”, provoca.
“É igual a muitos pequenos produtores de café. A gente começa a negociar e pagar muito mais do que eles recebiam antes, assim começam a ganhar mais dinheiro. Nisso, eles substituem suas janelas de madeira pelas de alumínio. Para eles, isso é valor, e eu celebro isso nesse cenário. Mas eu acho que num contexto mais de arquitetura, cair nessas armadilhas de ambientes genéricos é uma tristeza”, conta a entusiasta do design atemporal.
“Eu jamais vou me livrar desses móveis, de jeito nenhum. A casa tem que contar história.” O mobiliário apontado pela moradora vem dos mais inusitados destinos, desde uma mesinha adquirida há muitos anos do seu mecânico — a peça estava cheia de graxa, esquecida na oficina, e foi amor à primeira vista — até alguns garimpos vindos do bazar das Casas André Luiz.
Há também poucos itens de design que eram objeto de desejo, caso da poltrona Jangada, criada por Jean Gillon em 1968.

A empresária nunca contratou arquitetos, e foi assim também no Coffee Lab, seu café que acaba de ganhar uma nova unidade em Pinheiros: “Lá, na minha sala, as pessoas entram e falam: ‘Nossa, mas não tem cara de escritório’. É porque não é para ter”, conta sobre seu empreendimento, que funciona como extensão de seu lar.
Alguns móveis, inclusive, fazem intercâmbio, como a mesa de madeira da cozinha, que antes era da loja. Em seu processo criativo, Isabela cria seus próprios croquis — com escalímetro e papel manteiga de cozinha — e adora dar palpites nos projetos arquitetônicos das cafeterias que assessora como consultora.
Quando seu negócio ainda era um galpão em branco, em 2004, foi sentindo o espaço que sua dona o imaginou pronto. “Primeiro, eu preciso desenhar. Depois, só fico dentro do ambiente sentindo, aí as ideias começam a nascer”, detalha.
Sua morada atual é temporária, em breve a empresária quer se mudar para um espaço próprio para se ancorar — mesmo que por tempo limitado. “Hoje mesmo eu tenho uma visita agendada para ver uma casa”, diz com empolgação no olhar. Mas a mudança com data de validade não a impediu de fazer grandes transformações, incluindo quebrar muitas paredes.
“Eu não me importo, mesmo numa casa que não seja minha. Claro que não é irresponsavelmente, não vou gastar tudo o que tenho, mas investir no lar é investir em você mesmo, no seu conforto. Com essa vida que eu tive, de me mudar muito, a minha alma precisa disso. Se dá, eu faço.”
O processo de transformação foi intenso: ela criou um jardim do zero, integrou ambientes e a iluminação, elemento fundamental para Isabela, foi cuidadosamente trabalhada.
“Investir no lar é investir em você mesmo, no seu conforto. Com essa vida que eu tive, de me mudar muito, a minha alma precisa disso” Isabela Raposeiras
“O escritório tem uma luz maravilhosa, então, abri o acesso dele para a sala. Eu queria esta cena de profundidade, tá vendo?”, ela aponta para seu escritório, que agora pode ser visto até mesmo do quintal distante, através dos janelões de vidro que separam a sala da área externa. Na visão da moradora, a cozinha também necessitava dessa junção: “Era algo inegociável”.
Em suas moradias anteriores, esse espaço da casa sempre foi protagonista. Festeira e apaixonada por cozinhar, é ali que Isabela e o marido, Marcelo, recebem os amigos para almoços, jantares e outras confraternizações regadas a música e comida boa.
É na cozinha também que ela imprime uma das principais características de seu estilo: o de manter as coisas à mostra. Panelas, utensílios e xícaras ficam todos visíveis aos olhos, posicionados em armários sem portas.
“Por que a gente tem que esconder as coisas? Tudo o que você usa no seu dia a dia, um chapéu, um prato, um quadrinho que até pode ser feio, mas que tem uma história… Aqui, tudo vira decoração.”
O que vira décor também é sua espirituosidade, traço que sempre a acompanhou, até nos negócios. “Se você notar, tem sempre um humor. No Coffee Lab também tem umas coisas que tiram sarro da vida”, diz ela ao citar elementos como uma jarra de abacaxi, obras irreverentes, como as do grafiteiro Ozi, e até um armário retrô de banheiro usado para colocar bonecos e outras peculiaridades.
Apesar das mudanças de estrutura, Isabela quis manter a essência da casa antiga, construída por volta dos anos 1950, incluindo seus revestimentos em cedro, o piso de taco, as portas com vidros canelados e as gradezinhas com desenhos trabalhados.
“Temos que preservar as coisas preciosas da época, senão se perdem. Acho que só mudaria, além do que já foi feito, o revestimento da cozinha e dos banheiros, porque eles não têm carisma nenhum”, dá risada. Mas carisma, definitivamente, não falta nesse lar.
CRÉDITOS DE PRODUÇÃO
Texto Marina Marques
Fotos Mayra Azzi
Edição de arte Catarina Moura
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