Casa de vó: conheça um apartamento com décor cheia de boas histórias
O aconchego de uma casa de avó é o cenário ideal para a criação de vídeos do canal Avós da Razão, conheça o lar de Sônia Bonetti

Muitos dizem que a vida começa aos 60. A afirmação pode até parecer mais uma daquelas frases rasas carregadas de um falso otimismo, distante das dores da vida.
Contudo, foi exatamente nessa idade que Sônia Bonetti teve uma grande virada de chave, responsável por trazê-la a esse confortável sofá da sua sala — aliás, maior xodó de seu lar, localizado em São Paulo. Foi aos 60 anos que ela viveu uma reviravolta: separou-se, trocou o sítio onde morava pela cidade grande e conseguiu um novo emprego.

Para viver esse novo ciclo, mudou-se para seu apartamento atual, um pequeno imóvel de 60 metros quadrados, mas com capacidade para abrigar incontáveis histórias.
“Este apartamento era, em primeiro lugar, o que eu tinha de possibilidade financeira. Segundo, comecei a pensar o quanto a gente tem de supérfluo. Aqui dá para fazer tudo o que preciso”, afirma, hoje, aos 87 anos.
Seu lar é formado por poucas novas aquisições na decoração, já que os móveis, plantas e enfeites espalhados ali já passaram por outros tetos e vivências. Os quadrinhos que dão charme à parede atrás do sofá, por exemplo, são obra de sua avó, que era artista.
Apesar dos objetos cheios de valor sentimental, Sônia gosta de enfatizar seu desapego: “Eu já dei muita coisa para os meus netos e bisnetos. A minha casa está aberta para eles pegarem o que quiserem. Eu acho que as coisas têm que mudar de mão, não adianta as pessoas herdarem as coisas quando você morrer, você tem que ter o gosto de vê-las aproveitando. Por exemplo, não tenho mais joia nenhuma, quer dizer, não eram joooias, só umas bobagens [risos], eu dei tudo para minhas netas”.
“Não adianta as pessoas herdarem as coisas quando você morrer, você tem que ter o gosto de vê-las aproveitando” Sônia Bonetti, co-criadora do Avós da Razão
Morar sozinha aos quase 90 anos é apenas uma das muitas características de Sônia que vão na contramão do senso comum.
“Eu nunca tinha morado sozinha antes. Quando você divide o espaço, também divide o seu gosto, as necessidades de outra pessoa. Assim, não tem tanta liberdade. A minha curtição neste apartamento é que posso fazer tudo o que quero. Aliás, depois dos 60 anos, eu comecei a fazer tudo que eu queria, sem ter que dar uma explicação.”

Quando ela diz que gosta de fazer de tudo em seu pequeno apê, é tudo mesmo: desde atividade física online com uma personal que mora na Bahia, até gravar vídeos para as redes sociais.
Em 2018, Sônia juntou-se à amiga Gilda Bandeira, com quem mantém uma amizade de mais de 60 anos, para fazer algo que muita gente jovem não se arriscaria: criar um canal no YouTube.
“Foi uma coisa tão inusitada na nossa vida, porque sempre nos reunimos em um boteco pra tomar uma cerveja, pôr a conversa em dia: a Gilda, eu e quem mais aparecesse”, detalha.

“Depois dos 60 anos, comecei a fazer tudo que eu queria, sem ter que dar uma explicação” Sônia Bonetti, co-criadora do Avós da Razão
Gilda, que tem 83 anos e atuou por muitos deles como figurinista, está sempre que pode na casa da amiga. Ali, elas adoram relembrar momentos passados, dar risada e, é claro, de vez em quando seguir apreciando uma cervejinha.
“Só quando ela morava no mato que ficamos afastadas fisicamente. Quando retornou à capital, voltamos a frequentar o boteco juntas. Amizade é amizade, você não perde. Depois surgiram as Avós da Razão, e assim seguimos firmes e fortes”, declara Gilda.
Em 2018, enxergando o potencial desses encontros, a produtora e amiga da dupla, Cassia Camargo, perguntou se elas não topariam criar conteúdo para a internet.
“E a gente topou, porque somos de topar. Mas achávamos que era uma coisa temporária, que não teria tanta repercussão”, conta. Logo seus vídeos irreverentes ganharam grande impacto. Inclusive durante a pandemia, quando a dupla foi obrigada a gravar separadamente e se aventurar nos aprendizados tecnológicos.
“Tivemos que aprender a lidar com as redes, algo que não tínhamos tanta familiaridade. De repente, isso cresceu e se tornou uma coisa importante para muitas pessoas e também para nós.”
No começo, não foi fácil lidar com as ferramentas digitais, mas logo o canal virou também uma forma de ocupar a mente e se atualizar: “Você tem que estar sempre fazendo uma higiene no cérebro para não virar um velho chato e mal-humorado”, diz Sônia, indo direto ao ponto.
Foi com as Avós da Razão que Sônia e Gilda atingiram um público fiel e ansioso para ouvir as conversas da dupla em clima de “mesa de boteco”. Nas gravações — e fora delas também —, discutem temas divertidos, difíceis e também polêmicos de maneira leve e bem humorada. Relacionamento aberto após os 60, sexualidade e até luto são alguns assuntos que fazem sucesso nas @avosdarazao.
Com quase 430 mil seguidores apenas no Instagram, o projeto foi criado de maneira despretensiosa, mas tomou proporções muito maiores do que as duas jamais imaginaram.
“O primeiro objetivo era tirar o velho da cristaleira, como sempre digo, deixá-lo visível. Porque o velho tá durando muito, mas ainda pouco se fala sobre”, conta a moradora, que ressalta a vontade de retratar a velhice como algo leve.
“Porém, além do público mais maduro, as Avós da Razão atingiram também outras idades”, acrescenta sobre os seguidores mais jovens, que adoram enviar dilemas nas caixinhas de perguntas criadas pelas influenciadoras.
COMPANHIA DE SI MESMA
Em muitos desses vídeos gravados pela dupla, a casa de Sônia funciona como cenário, e o clima de papo entre amigas faz com que os fãs das influenciadoras sintam-se como visitas.
“Aqui não tem estúdio. O espaço é a minha casa, minha sala, a cozinha que dá para ver daqui”, ela descreve o cantinho que costuma utilizar para as gravações. É em seu sofá, sentada ao lado de Gilda, que muitas das melhores conversas acontecem.
“Quando entro na minha casa, sinto até o cheiro gostoso dela. Sinto um contentamento, uma espécie de complemento da minha vida”, declara Sônia. Também não falta bom humor para falar sobre seu espaço favorito: “Gosto muito do meu sofá. A minha filha diz uma coisa interessante, que o sofá é que nem cama de cachorro [risos]. É muito da gente!”.
Com uma cozinha integrada ao estar, é muitas vezes ali que ela produz também conteúdos cozinhando para si mesma, uma de suas tarefas favoritas.
“A gente reúne as amigas íntimas, eu não tenho muito espaço, mas sempre dá para recebê-las”. Apesar de amar as reuniões com as parceiras e apreciar um passeio fora de casa, Sônia não nega que seus momentos favoritos envolvem curtir sua própria companhia — principalmente relaxando enquanto faz bordado.
“Vivo sozinha, feliz da vida, e pretendo continuar sozinha, tendo a minha autonomia. E a minha vida tá boa, viu? Não tenho do que me queixar. Eu me curto, em primeiro lugar. Não sinto solidão de jeito nenhum, minha vida é cheia”, afirma com uma confiança admirável.
CRÉDITOS DE PRODUÇÃO
TEXTO Marina Marques
FOTOS Mayra Azzi
EDIÇÃO DE ARTE Catarina Moura
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